09/11/2022 06:00 - Por Prof. Rafael Nogueira

Democraticamente se justificam prisões, censura e a implantação de todo um clima de terror e medo; por outro lado, fontes fidedignas apontam, extremistas violentos fazem passeatas e paralisações, cantando – pasmem – o hino nacional em rodovias e estradas. Por vezes sendo democraticamente atropelados. Que democracia é essa?

Quem passou pela escola sabe que democracia é palavra que vem da velha Grécia. Realidade apenas de uma de suas cidades-estados, era uma forma de organização em que homens livres, bem-nascidos e proprietários exerciam o poder mediante eleições, sorteios, revezamentos.

As palavras não podem ser transportadas por 2.500 anos sem 2.500 cuidados – as semelhanças são poucas e as diferenças são muitas. Cabem no Brasil umas 5 mil Atenas. Mas ficou uma ideia residual: é o governo de muitos.

A república romana bebeu dessa fonte, mas, outra realidade, fez de seu sistema um modelo em que “os muitos” têm vez, mas respeitando também toda uma hierarquia de autoridades. República, portanto, não era sinônimo de democracia, nem o inverso de monarquia. Daqui ficou a lição do regime misto como algo mais duradouro, que combina muitos (povo) com poucos (elite), e estes com uma autoridade superior.

A república caiu e veio o império, que teve pouco ou nada de democrático, e foi sucedido por uma fase de predomínio de guerreiros e clérigos, em que se combinavam em modelos diversos igreja, rei, nobres e povo. Chegou a nós a reverência a Deus.

Foi com o absolutismo que a variação nas lealdades e demarcações territoriais foi dando lugar às identidades nacionais: o rei se impõe, e por justificá-lo escrevem-se teorias diversas, das mais teológicas às mais racionalistas. É o momento em que nascem os estados.

Só no estado pode haver paz para o comércio, e um âmbito fechado e organizado no qual discussões democráticas podem aflorar. Mas democracia só aparece mesmo quando se torna urgente impor ao rei limites que, não sem dificuldade, ainda vigoram: os direitos e as liberdades essenciais.

A tendência se irradiou pela Europa, depois por suas colônias, e o aprofundamento dessas demandas levou a revoluções e independências, que herdaram do velho governo misto os freios e contrapesos, e da teoria política a separação e a dinâmica dos poderes. Assim, os territórios se consolidam, e os povos se afirmam sobre as autoridades.

No século XX a palavra brilhou, e, ao mesmo tempo, se descaracterizou. Os totalitarismos (fascismo, nazismo e comunismo) deram ao mundo demonstrações de tirania nunca antes vistas. A guerra quente esfriou, e a democracia virou paradigma.

Velhos tiranos como Vargas, e totalitários não vencidos como Stálin, passaram a falar em nome da democracia. Hoje, Maduro, Kim Jong-Um, Fernandéz etc. também o fazem. Mas já não é aquele governo de muitos em um estado separado do transcendente mas não a ele alheio, com separação de poderes sob freios e contrapesos, e direitos e liberdades assegurados.

Fica a questão: se é outra coisa por que não tem outro nome?